26 de novembro de 2007

Adormecida


Eu rabisco; o príncipe
se arrisca e rasga em espinhos.
Envolvo malévolo

a bela em trama de letra;
o Felipe o beijo almeja.

13 de novembro de 2007

Lunático


Essas letras são sobras
de um lundu que se deu
na lua entre um nativo
(poeta e idiota) e
um leitor estrangeiro
(que ora mora tranquilo
no solo definido,
que lhe parece inócuo)
que eram meio que o mesmo
aspirante de verso,
aspirador de vácuo,
arqueólogo que agora
junta essas provas, sobras,
falhas, disfarces de uma
lo(u)cução.

11 de novembro de 2007

Extrapolação


Não dá mais. Eu tinha
que escrever um haicai mas
eis o fim da linha.

O leitor pegue daqui
que eu vou sair por aí.

8 de novembro de 2007

ROETHKE, Theodore. O forró do papai


A pinga no bafo dava
Pr’um menino ficar tonto,
Mas com força eu segurava;
O forró fora do ponto.

Dançar, até as panelas
Pularem da prateleira;
Refletida em todas elas,
Minha mãe de cara feia.

A mão travada em meu pulso;
O nó do dedo ferido.
E pra cada passo avulso
Vinha a fivela no ouvido.

Marcava em minha moleira
O passo com palma suja
Até me largar na esteira
Sem que eu largasse da blusa.



***

MY PAPA’S WALTZ


The whiskey on your breath
Could make a small boy dizzy;
But I hung on like death:
Such waltzing was not easy.

We romped until the pans
Slid from the kitchen shelf;
My mother’s countenance
Could not unfrown itself.

The hand that held my wrist
Was battered on one knuckle;
At every step you missed
My right ear scraped a buckle.

You beat time on my head
With a palm caked hard by dirt,
Then waltzed me off to bed
Still clinging to your shirt.


______
ROETHKE, Theodore. My papa’s waltz. In: ______. The collected poems of Theodore Roethke. New York: Anchor Books, 1991. p. 43.

28 de outubro de 2007


Quem sou eu senão
alguém que ora vem de então
e vai pro porvir?

Cuja argamassa de sopro
arde e arde até que passa?

23 de outubro de 2007


Fazer o que é certo
compensa. Por que não tenta
sem ninguém por perto?

11 de outubro de 2007


Eu só quero ver
como é que vai ser a outra
face do cristão.

8 de outubro de 2007


Minto, roubo, mato
e, graças a Deus, eu sei
que serei perdoado.

Insone poesia.
Valiumverso quanto pesa
curando a vigília.

6 de outubro de 2007


Vês o que fizeste?
Pintaste com piche o solo
e o azul celeste.

Não sei se compreende
que é a mais pura verdade
o que lhe desdigo.

27 de setembro de 2007

Ana


Risco pra deixar
um certo traço do mar
de amor que lhe oferto:

hosana ao sutil gigante,
à paisana no alfabeto.

2 de setembro de 2007


Quem é barulhento
quer mostrar-se pleno por
não ter nada dentro.

30 de agosto de 2007


A outrem atado,
carregando, carregado,
à volta da arena

em sempiterna demanda
de não sei bem mais o quê.

27 de agosto de 2007


Atravessei a
rua sem dó nem piedade
e me atropelaram.

22 de janeiro de 2007


Mesmo rabiscada,
a vida sai tal e qual:
cuspida e escarrada.